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segunda-feira, outubro 27, 2003

DÁ-LHE, PACHECO! : Soube bem ouvir José Pacheco Pereira (JPP) ontem no Jornal da Noite, na SIC. No seu habitual comentário semanal (estou a ficar fã) JPP denunciou aberta e corajosamente os rituais cobardes de muitas das praxes universitárias, que por esta altura do ano ressurgem entre nós, lembrando-nos cruelmente donde viemos, quem somos e para onde vamos. As suas observações não são novas, mas são pertinentes. As praxes, tal como têm sido popularizadas entre nós nos últimos anos, estão longe de serem rituais civilizados e calorosos de recepção àqueles que entram numa fase da sua vida escolar: regra geral são um circo chunga de perpetuação das piores facetas da juventude e dos estudantes. A obediência cega e a humilhação como forma de ser aceite, a degradação física, o desprezo pela dignidade humana, a cultura pimba, está tudo lá. JPP toca ainda num ponto importante, mas para muitos incómodo: mesmo durante o Estado Novo (regime que abomino), estas práticas eram pura e simplesmente proibidas, salvo em Coimbra, onde o peso da tradição levava as autoridades a serem mais benevolentes. Hoje, com a massificação do Ensino Superior, os alunos do mais ignoto Politécnico de Vale da Burra ou de Alguidares de Baixo entregam-se não raras vezes a orgias saloias de humilhação com o objectivo de “integrar” os caloiros. Os arrepiantes acontecimentos do ano passado no Piaget de Macedo de Cavaleiros (sevícias sexuais sobre uma aluna) e deste ano, no Politécnico de Coimbra (um estudante obrigado a arrastar um tijolo com um cordel amarrado ao pénis) estão aí para o mostrar. As associações de estudantes e reitorias, essas, continuam alegremente a proteger e encorajar estas práticas, dando a pior imagem possível dos estudantes na comunicação social, para a sociedade. Depois queixam-se que está não lhes dá apoio na luta contra as propinas ou pela acção social escolar. Admirem-se… JR
BOAS NOTÍCIAS: É verdade que tenho andado e vou continuar a andar atulhado em trabalho, mas felizmente que hoje consegui uma nesguinha de tempo para a quadrilhice. Aproveito assim esta pequena pausa para pôr os Meninos em dia. Em primeiro lugar, há óptimas notícias. A Paula tem mais um primo: o Simão nasceu a 15 de Outubro e os Meninos de Ouro desejam-lhe uma vida longa e feliz. São parabéns atrasados mas do fundo do coração. Por outro lado, parece que o Ricardo já domina a arte de bem blogar em toda a sela. Estes dois últimos posts dele foram feitos a partir do seu PC, o que também são excelentes notícias: sem o Ricardo a full time, este blog encontra-se apenas a 30 por cento: os restantes 30 seriam da sua participação e os restantes 40 da sinergia. E se dissesse que o Ricardo vale 70 por cento do blog também não estaria a exagerar. Dentro de dias, e do seu punho, vem aí a segunda parte da série “Portugal e a Europa”, desta vez focando a integração europeia de Portugal e a Constituição Europeia. Tremei, pecadores… JR

quarta-feira, outubro 22, 2003

A GOTA DE ÁGUA: Miguel Sousa Tavares é dos melhores comentadores televisivos que temos. A TVI bem pode orgulhar-se de ter o melhor conjunto de comentadores da nossa praça.
Eu reflectia semanalmente sobre as opiniões e ideias desse homem sereno e inteligente, mas recentemente agastei-me com as constantes interrupções da jornalista Manuela Moura Guedes, que impedia Sousa Tavares de se exprimir de forma contínua, encadeando os factos.
Deixei de ver esse lamentável espectáculo e por isso ouvi hoje com grande surpresa um colega que me contou que ontem Sousa Tavares disse frontalmente: “Manela, se continuas a interromper-me não posso desenvolver o raciocínio e o melhor é passarmos imediatamente ao assunto seguinte”; “O professor Marcelo fala sem qualquer interrupção, e eu tenho o mesmo direito”.
Não sei se foi exactamente isto que ele disse, mas se foi tanto melhor, pois a mensagem passou sem sombra de dúvida e, mais importante, aquele “Manela” indica uma familiaridade entre ambos, proximidade essa que tenho para mim que se irá manter, assim como estou certo que o comentador vai passar a falar como o fazia quando chegou à TVI. Por isso, vou voltar a vê-lo na televisão! RM

terça-feira, outubro 21, 2003

UM DESPORTO DIFERENTE: Sempre gostei de assistir aos jogos do mundial de râguebi, com toda a sua classe e esplendor desportivo; foi por isso com enorme indignação que soube que este ano a SporTV ficou com o monopólio das transmissões. Aceito que as transmissões pertençam ao canal que mais pague; o que não aceito é que os restantes canais (RTP 2, Eurosport) não apresentem resumos, nem reportagens. Vi algumas imagens na Eurosport, mas duraram apenas 30 segundos! E os outros jogos, onde é que estão?
Desiludido, reconheci que em Portugal este desporto não tem simpatizantes suficientes para a televisão pública entrar nas negociações das transmissões. De facto, os países onde o râguebi está mais desenvolvido são aqueles onde existem vastas pastagens durante todo o ano: Ilhas Britânicas, França, África do Sul, Austrália, Nova Zelândia, arquipélagos da Melanésia e Polinésia...
Mas por cá também se joga, embora não haja muitos espaços relvados com as dimensões apropriadas. Ontem convidaram-me para um treino, e hoje fui ter à  Cidade Universitária, onde se encontravam 25 colegas meus.
Alongamentos, corrida, treino com toques (em vez de placagem) e finalmente um treino com placagens. Com os meus 60 Kg pouco pude fazer para impedir a passagem, a 15 Km/h, de colegas adversários com 80 Kg...mas diverti-me muito, corri bastante, não me magoei e comecei a compreender as tácticas e a mí­stica do jogo. Estavam a treinar outros 3 grupos (cada um num meio-campo de râguebi) e mal saimos entraram mais quatro grupos. Sexta-feira há mais. Lá estarei, não sem uma protecção de dentes, mas com muito entusiasmo. RM

segunda-feira, outubro 20, 2003

PORTUGAL E A EUROPA (I): Ao longo da nossa história houve várias tentativas de aumentar o território português à custa de Castela, da Galiza e mais tarde de Espanha, por forma a reforçar a nossa independência. D. Afonso Henriques tentou fazê-lo várias vezes, mas falhou. O seu génio consistiu em mobilizar todas as forças nacionais para um projecto alternativo: a reconquista a sul, que garantiu ao nosso país a dimensão geográfica e demográfica mínima para aguentar, nos séculos seguintes, as ofensivas Castelhanas.
A língua Portuguesa tem sido o factor mais importante para a nossa independência, mas por si só não é suficiente: prova disso são o Catalão e o Basco...
De facto, alguns reis e outros grandes homens e mulheres portugueses compreenderam que o país precisava de aumentar o seu poderio económico, militar e cultural, sob pena de ser submerso pelo crescimento castelhano. Assim, após Aljubarrota, havia três caminhos a seguir: tentar crescer com os meios nacionais; expandirmo-nos na direcção da Europa; expandirmo-nos numa direcção que não fosse a europeia – foi esta a que seguimos, e por isso nos espalhámos por quase todo o Globo.
A Expansão teve custos elevados, mas os benefícios excederam até as expectativas mais altas. Só que os Descobrimentos e o Império que deles nasceu não devem ser vistos apenas como um reforço da riqueza, do poder e da cultura de Portugal. Foram um conjunto extraordinário de experiências, aventuras, factos e acontecimentos, que juntos constituem um património Histórico do qual poucos países com a nossa dimensão se podem orgulhar. Não me admiro nada por Luís de Camões, o maior escritor português de todos os tempos, ter nascido e vivido nessa época que foi gloriosa, infame, e sobretudo cheia, rica de mil e uma situações diferentes e nunca antes vividas por ocidentais (salvo raras excepções, como Marco Polo).
Quando se deu a Restauração, o país pediu apoio à Europa (França e Inglaterra) e ao Império (sobretudo o Brasil). Não houve a arrogância de nos afastarmos da Europa, o que teria sido fatal, nem a ingenuidade de nos afastarmos do Império, o que teria sido o fim. Vencemos a Espanha na península ibérica, e a Holanda no Atlântico. Mas após a Restauração, o estado português cometeu erros cruciais, o que ainda hoje leva a que tenhamos décadas de atraso na convergência com a Europa Ocidental: o país fechou-se ao Iluminismo e à revolução industrial, na Europa. E não desenvolveu uma colónia sólida e orgulhosa no Brasil, como os ingleses fizeram na América do Norte. As reformas do Marquês adiaram a implosão de Portugal por uns anos, mas após o afastamento do estadista, era apenas uma questão de tempo até Portugal ser completamente arrasado pela superioridade militar, económica e cultural dos povos que nos queriam destruir para sempre. Não aproveitámos o melhor da Europa nem desenvolvemos os territórios ultramarinos: por isso fomos invadidos por franceses e espanhóis, perdendo assim Olivença, território que, sinceramente, tenho a certeza que nunca recuperaremos, tal como a Espanha nunca recuperará Gibraltar.
Entrámos assim no século XIX, o nosso “século horribilis”, como disse e bem o banqueiro Ricardo Salgado. Esse século foi dramático por vários motivos: o país só teve dez anos seguidos de paz a partir de 1851; tomámos conta pela primeira vez do nosso atraso estrutural perante a Europa Ocidental; esse atraso podia agora ser a causa da perda de independência nacional; e quanto a uma expansão pelo mundo, o país estava demasiado esgotado para embarcar em novas aventuras.
A primeira metade do século XX foi dedicada a reparar os danos do século XIX. Em 1945 o país estava em posição priveligiada para se lançar na reconstrução da Europa e para investir na educação e riqueza em África. Teria sido fácil igualarmo-nos ao avanço da Escandinávia e dos parceiros do Tratado de Roma. Mas a liderança arcaica do país voltou a preferir que nos fechássemos sobre nós mesmos, e Portugal adormeceu, enquanto a Europa acordava. Mas o pior ainda estava para vir.

António Lobo Antunes descreveu no seu livro “Os Cus de Judas” o inferno que foi a guerra do Ultramar. Exagerou nas críticas aos portugueses que lá viviam, mas deixa-nos a perfeita verdade de ser impossível construir e manter para sempre uma Odivelas ou uma Celorico de Basto no meio do capim interminável. A negação dessa verdade custou ao nosso país uma geração perdida de 800000 homens, e 600000 retornados, que seriam mais felizes numa democracia africana que tivesse sido construída com bases sólidas a partir de 1945, o ano em que a nossa própria democracia devia ter sido implantada através de uma revolução de generais. Foram os capitães de Abril que restituíram a Portugal a dignidade e a liberdade. Após a revolução era preciso escolher entre a Europa, a União Soviética e os países de língua oficial portuguesa. Escolheu-se a Europa, mas foram esquecidos os laços de ligação aos outros povos que falam o Português. Foi um erro muito grave, mas ainda estamos a tempo de o emendar.

Após esta pequena meditação sobre a manutenção da soberania portuguesa face à Europa, estou em condições de começar a escrever sobre a futura Constituição Europeia. RM

sábado, outubro 18, 2003

VOLTO JÁ: A braços com uma valente carraspana e muito trabalho, este Menino só voltará daqui a alguns dias. Take care. JR

quinta-feira, outubro 16, 2003

AINDA BRAGANÇA: Da nossa leitora Susana Pires:

Sou leitora assidua do seu blog, mas confesso-me desiludida com as incorrecções flagrantes que encontrei no último post, facilmente evitáveis com uma pesquisa mesmo superficial ou até uma leitura atenta do artigo da Time, que é livremente interpretado neste post.

"BRAGANÇA: A aldeia está em alvoroço. Ao que parece, a capa da Time desta semana chama a atenção para o facto de a outrora pacata e mui católica cidade de Bragança se ter transformado num bordel de dimensões europeias, o que chocou muitos de nós. "

A aldeia está em alvoroço?! Que aldeia? Bragança não é uma aldeia, nem mesmo uma vila há pelo menos 5 séculos, é cidade desde 1464 (segundo Foral concedido por D.Afonso V), fará portanto no proximo ano 540 anos, o que faz dela uma das mais antigas do país. Mais ainda, é uma das nossas capitais de distrito, titulo que como deve saber não pode ser atribuido a uma aldeia.

"É uma história triste: Bragança está a sofrer um lento e terrível golpe social com a explosão da prostituição e todas as suas consequências (SIDA, criminalidade, desagregação familiar, etc.) exponenciadas pelo facto de se tratar de um meio pequeno e rural. "

A cidade ainda não está a sofrer nem lento nem terrivel golpe social. O caso começou há precisamente 1 ano e ainda não teve as consequencias sociais que lhe são atribuidas. Segundo o ultimo relatório da AIDS Portugal, Bragança era a 3a cidade portuguesa com menos casos de SIDA, é uma das cidades com menos criminalidade e os casos de desagregação familiar causados por esta situação são pontuais e identificados pela comunicação social, eram 4, em Julho. Bragança não é um meio rural sendo que rural por definição "diz-se da freguesia situada fora da vila ou da cidade" e a sua principal actividade não é a agricultura mas sim o comércio e os serviços.

Embora a meu ver estes não sejam os aspectos cruciais do post, que a meu ver toca um tema de premente exprimindo um ponto de vista com o qual concordo, penso que se justifica uma rectificação de incorrecções tão flagrandes como as que enumero em cima e que comprometem a meu ver o prestigio deste blog.

Este é o espírito português que além de não defender o que é seu, empola, agrava e eleva ao expoente máximo cada crítica que lhe é lançada. A cidade como o próprio artigo diz é agradável, segura e tem uma população universitária de vários milhares de alunos, a vigilância pouco apertada o que constitui um atractivo para este tipo de actividade As prostitutas são brasileiras e os empresários portugueses. Isto acontece em dezenas de cidades, em dezenas de países, todos os anos. Cabe-nos a nós portugueses, desdramatizar a situação, trata-la com naturalidade e por favor, não extrapolar o problema com afirmações não fundamentadas.



Cara Susana: Obrigado pela sua mensagem e pelos seus esclarecimentos. De facto, o meu último post foi escrito no próprio dia em que se soube da notícia (ontem) e numa altura em que ainda não tinha lido o artigo da Time. Neste blog tenho por hábito não comentar os “maiores” assuntos ainda a quente, procurando reflectir e informar-me antes, de modo a evitar deslizes como estes. O nosso post sobre a demissão dos ministros Lynce e Martins da Cruz é disso um bom exemplo. Por outro lado, vejo que na sua mensagem não toca no segundo nem no terceiro parágrafo, que para mim eram os mais importantes. O que é bom: estamos de acordo no essencial.

Quanto à palavra “aldeia”:

Há aqui um equívoco: quando escrevi a palavra “aldeia” não me estava a referir a Bragança, mas sim a Portugal. Mais especificamente, referia-me à reacção de nervosismo histérico que o artigo da Time provocou entre nós, reacção bastante curiosa se atentarmos ao facto de esta história ser já conhecida há vários meses e de nunca ninguém se ter escandalizado. Tudo isto num país cujo número de habitantes não andará muito longe do número de assinantes da Time em todo o Mundo. Daí a palavra “aldeia”. Nunca pretendi menorizar Bragança nem apoucar a cidade ou os seus habitantes. Se foi essa a sua leitura, as minhas desculpas.

Quanto ao “lento e terrível golpe social” que mencionei:

Vejo que também exagerei nas palavras. Tem razão ao dizer que uma simples leitura do artigo da Time (que pelos vistos dá uma imagem correcta da cidade) evitaria incorrecções destas. Mas cuidado: a imagem que eu dei é precisamente aquela que a comunicação social portuguesa, nomeadamente as televisões, tem dado do impacto da prostituição em Bragança, nestes últimos meses. Diga-se de passagem também que as famosas “Mães de Bragança” (mas quem é que elas se julgam, as “Mães da Praça de Maio” da Argentina?) e a sua histeria folclórica prestam um serviço muito pior à imagem de Bragança em Portugal do que as minhas gaffes, ao apresentar a cidade quase como uma versão moderna de Sodoma. São elas que precisam de ouvir das boas, não eu.

Mais uma vez: as suas (preciosas) correcções referiam-se ao parágrafo introdutório que escrevi no post, que era apenas um mote para opinar sobre a actuação do ministro Arnaut e o problema da prostituição em geral, nas nossas cidades. Como não tocou nestes pontos, presumo que esteja de acordo comigo neles, o que registo com agrado. Além do mais, leitoras atentas e exigentes como a Susana são o sonho de qualquer blogger. Escreva sempre! JR

quarta-feira, outubro 15, 2003

BRAGANÇA: A aldeia está em alvoroço. Ao que parece, a capa da Time desta semana chama a atenção para o facto de a outrora pacata e mui católica cidade de Bragança se ter transformado num bordel de dimensões europeias, o que chocou muitos de nós. Alguns comentários:

É uma história triste: Bragança está a sofrer um lento e terrível golpe social com a explosão da prostituição e todas as suas consequências (SIDA, criminalidade, desagregação familiar, etc.) exponenciadas pelo facto de se tratar de um meio pequeno e rural. Mas sejamos claros: não é isto que perturba a opinião pública (como nunca foi, dado que há meses que se sabe disto e o país nunca se comoveu) mas sim o facto de, a partir de hoje, isto se saber em todo o Mundo. Afinal, Portugal deixou de ser o único país do Mundo onde não havia prostituição. Quem diria...

Quando soube que o Governo Português, na pessoa do ministro José Luís Arnaut, tinha cancelado toda a campanha promocional ao Euro 2004 na Time, doeu-me. Palavra de honra. Não aprendemos nada. Alguém imagina o Governo Espanhol a cancelar a maravilhosa campanha "Espanha Marca" após uma qualquer notícia na imprensa internacional sobre o elevado desemprego, as condições de trabalho dos emigrantes magrebinos ou os ataques terroristas da ETA? Não. É de facto confrangedor ver que temos um ministro que, em pleno século XXI, num mundo globalizado onde já nada é segredo, ainda venha malhar na primeira revista estrangeira que fale de outra coisa do nosso país que não do vinho tinto ou das nossas belas praias. Só Portugal fica a perder com esta atitude serôdia e irreflectida. A Time não precisa da publicidade ao Euro 2004 para nada. Portugal precisa e muito. Daqui a duas semanas, quando já ninguém se lembrar de tudo e a indignação de sacristia se tiver esfumado, o balanço será simples de fazer: o maior acontecimento desportivo de sempre em Portugal terá perdido a excelente montra que era a revista mais lida do Mundo. Aquela largueza de vistas do costume.

Já é tempo de um debate sério e maduro sobre a prostituição ter lugar no nosso país. É um assunto complexo e não tenho soluções mágicas, mas proponho desde já uma: prostituição regulamentada, vigiada e a pagar impostos. A minha ideia parte de uma premissa fundamental: a prostituição é uma actividade inerente à civilização humana. Havia bordéis nas primeiras cidades da Mesopotâmia e também os haverá nas últimas cidades que resistirem ao avanço do Sol sobre a Terra, daqui a muitos milhões de anos. Quem não aceitar este facto vive noutro mundo e não entende um pingo da natureza humana. Partindo deste ponto, que tal tirar as mulheres das nossas ruas para as por a trabalhar condignamente em locais vigiados, limpos e seguros, ganhando o seu próprio dinheiro e sem estarem sujeitas à coacção e à violência de proxenetas? E que tal serem locais registados pelas autoridades, cadastrados e regularmente vigiados por médicos, minorando assim a propagação de SIDA e de outras doenças? É tempo de perguntar a nós próprios se queremos manter o actual stato quo de ruas proibidas, bairros perdidos (vide Intendente), violência e SIDA a espalhar-se, ou se, pelo contrário, queremos as nossas cidades mais respiráveis e as prostitutas tratadas como seres humanos e não como animais. Para mim, este problema não necessita de moralismos. Apenas de pragmatismo e bom-senso. JR

À MENINA: Na madrugada de segunda-feira ficou decidido o desfecho de mais um Mundial de Futebol feminino. No Home Depot Center, em Los Angeles, a Alemanha bateu a Suécia por 2-1 no prolongamento, graças a um livre directo (precedido de falta inexistente) marcado pela suplente Nia Kuenzer. As campeãs europeias juntaram assim mais um título ao seu pecúlio. Por cá, a competição quase passava despercebida ( que contraste com o Mundial 2002! ), não fossem as transmissões da SporTV e os resumos do Eurosport. Nada disto é de admirar, visto a modalidade ser quase clandestina em Portugal. É até curioso reparar que, regra geral, as grandes potências do futebol feminino (Estados Unidos, Suécia, Noruega) são justamente países onde as mulheres se emanciparam mais cedo e onde já têm um longo historial de participação cívica. Penso que isto explica em parte a quase insignificância de Portugal na modalidade.
Por outro lado, tive pena de não ter acompanhado a competição com mais atenção (malhas que os fusos horários tecem), visto que simpatizo com o futebol feminino e por várias razões. Para além das estéticas (que não vêm ao caso, embora a Aly Wagner seja uma delas), é desportivamente um jogo infinitamente mais civilizado e agradável de seguir do que o seu homólogo masculino. Basta dizer que no Estados Unidos-Alemanha de 6 de Outubro forem cometidas 28 faltas no total, dez (10!) das quais apenas na primeira parte. Isto dá uma falta quase de cinco em cinco minutos, um número impensável no futebol "a sério". Até hoje, "jogar à menina" ou "Suas meninas !" eram expressões pouco abonatórias para qualquer jogador da bola que se prezasse. A partir de agora são, para mim, elogios. JR

CHUVA: Num semáforo, sem carros à minha frente, vejo a chuva, generosa e abundante a cair sobre a estrada. Já tinha saudades do Outono. JR

segunda-feira, outubro 13, 2003

ALBERTO GONÇALVES: Este senhor é talvez a única razão pela qual um homem civilizado deve ler o Correio da Manhã. Tambem vale a pena passar pelo blog dele. JR

sexta-feira, outubro 10, 2003

Queridos amigos:

Como escrevemos no nosso post inaugural, este é, entre outras coisas, um blog de opinião sobre temas e casos e que, desde que com elevação e fair-play, não temos problemas em discutir nenhum tema ou caso, por mais polémico que seja.
Mas há limites que não devemos nem queremos ultrapassar. Por essa razão, e para bem da nossa sanidade mental (e esperamos que da vossa também) não iremos daqui em diante comentar qualquer desenvolvimento do obsceno "caso" da Casa Pia. Daqui a alguns meses ou anos (se nessa altura ainda andarmos pela blogosfera), quando as sentenças estiverem lidas, os criminosos punidos e os inocentes ilibados (como esperamos que aconteça) prometemos, aí sim, dizer de nossa justiça. Até lá, não queremos ser parte do circo já montado pelas televisões e pelos partidos, nem do destempero de opinião no qual muito boa gente das televisões, dos jornais e dos blogs já embarcou. Ainda a procissão vai no adro e já demasiadas asneiras se disseram e já demasiada gente se "enterrou" estupidamente. E a verdade é que às crianças, as únicas e verdadeiras vítimas, já ninguém poderá devolver nem a infância nem a inocência roubadas. Quanto a nós, só nos resta esperar tranquilamente que se faça justiça e que o dia em que este inferno acabe chegue depressa. Nesse dia falaremos.

quarta-feira, outubro 08, 2003

MAIS DOIS LINKS: A partir de hoje temos mais dois links na nossa lista. O primeiro é o Flor de Obsessão, de Pedro Lomba, um dos autores da saudosa Coluna Infame. Agora que retomou a sua actividade bloguística há poucas semanas, é tempo de lhe fazer uma visita. O outro é o d’ O Complot um blog que tal como o nosso, também é feito por rapaziada sub-21/23 e que passa a ser a partir de hoje, depois de o descobrir, um dos meus locais de passagem obrigatória na blogosfera. Fogo à peça! JR

terça-feira, outubro 07, 2003

A MORTE DOS ARTISTAS: Parece que fizemos bem em esperar uns dias até que a poeira assentasse e pudéssemos escrever um post mais calmo e informado sobre o triste incidente envolvendo a filha do Ministro dos Negócios Estrangeiros, Martins da Cruz. Isto porque ao princípio da tarde fomos surpreendidos pela notícia do pedido de demissão do mesmo. Agora sim, parece-nos ser possível desenvolver as nossas impressões sobre tudo isto. Visto que os factos já foram exaustivamente narrados pela Comunicação Social, não os iremos repetir. Apenas alguns comentários:

Todos conhecemos (por experiência própria ou pelo que ouvimos) o calvário de sacrifício, esforço e renúncia pelo qual é necessário passar para entrar num curso de Medicina em Portugal. Durante os últimos anos do Secundário, muitos milhares de jovens por esse país fora renunciam àquilo que poderiam muito bem ter sido alguns dos melhores anos da sua vida. A espera pela entrada é também um momento de enorme ansiedade para as suas famílias que, não raras vezes, se sacrificam também nessa ansiedade de ver um dos seus filhos a atingir o tão almejado curso. Daí a indignação que os casos de “cunhas” para Medicina tantas vezes provocam. Mas sejamos claros: casos de favorecimento no acesso à Universidade (o que se passa em certos colégio privados durante os exames é um escândalo) sempre houve e sempre haverá. Mas justamente por ser a filha de um ministro a tentar entrar para Medicina, o caso adquiriu as proporções que se viram. Era uma mistura explosiva e bastou uma investigação da SIC para tudo ir pelos ares. Por isso, meus senhores, mudem a lei, façam o pino, o que entenderem, mas algo tem que mudar. O destino de famílias que tanto investem na entrada dos seus filhos em Medicina é algo que nos parece demasiado sério para que tudo aquilo que referimos fique como está.

Independentemente das razões a montante, o Governo perdeu estupidamente, e no espaço de cinco dias apenas, dois ministros acima da média e que muita falta lhe farão. Martins da Cruz era um diplomata de carreira e um estadista puro-sangue. A sua longa experiência ao cabo de 32 anos a servir o Estado Português em várias embaixadas e instituições internacionais dava-lhe a credibilidade e conhecimentos para poder defender os interesses portugueses na União Europeia, agora que se aproximava o momento decisivo das negociações sobre o alargamento e a Constituição Europeia. Por outro lado, implementou o conceito de diplomacia económica pela primeira vez entre o Corpo Diplomático Português no exterior, com um sucesso que começava agora a dar os seus frutos. Quanto a Pedro Lynce, é igualmente outro ministro que fará falta. A sua coragem para por um ponto final no imoral sistema de financiamento do Ensino Superior (revolucionando as propinas), aliada a um invulgar espírito reformista e um profundo conhecimento dos seus dossiers, são características (apenas para citar algumas) difíceis de igualar por quem quer que lhe suceda.

Ambos os ministros se demitiram e bem. Lynce, num acto de hombridade pedagógica, foi ao Parlamento apresentar a sua demissão aos representantes dos eleitores no próprio dia. Entendeu que mesmo que não se lhe pudessem ser assacadas responsabilidades, a suspeição que sobre ele recairia poria em causa a sua posição nos duros debates que se avizinham sobre o financiamento do Ensino Superior. Martins da Cruz, se bem que em circunstâncias mais nublosas, também o fez e muito bem. Ao contrário de Luís Delgado (DN), entendo que em certas circunstâncias a demissão é mesmo a única saída digna para quem se mete em tais caldeiradas. Caso estes dois senhores não tivessem resignado em tempo útil, a nuvem de suspeição tornar-se-ia tóxica e os mexericos que choveriam iriam corroer por longas semanas estes dois governantes, causando danos colaterais ao Governo e talvez mesmo ao Primeiro-Ministro. As suas demissões foram sensatas e higiénicas.

Como lucidamente observou Mário Bettencourt Resendes, na SIC Notícias, esta tarde, os políticos de hoje deveriam ser um pouco menos ingénuos se querem sobreviver no poder. Churchill tinha relações menos claras com empresas privadas e respectivos financiamentos aos Conservadores. Enquanto Presidente, Kennedy fazia aquilo que sabia com o primeiro rabo de saias que lhe aparecesse à frente. Mesmo políticos deste calibre não sobreviveriam muito tempo ao escrutínio da comunicação social, caso exercessem o poder hoje em dia. Cada vez mais os telhados são todos de vidro e o mínimo erro é a morte do artista. Quando é que esta gente aprende?

Finalmente, uma última reflexão. Não faltou por aí quem lançasse ao vento durante estes dias "Isto é uma choldra!" ou "Isto está feito é pós poderosos e pós filhos dos ricos!" ou ainda "Eles andam-se masé todos a encherem-se!". Como é óbvio, estas súbitas febres justicialistas e populistas nada nos dizem. A vida continua, a memória dos Homens é curta e o melhor que temos a fazer é tranquilamente debater o caso, aprender com os erros e seguir em frente. JR

segunda-feira, outubro 06, 2003

START ME UP: A nova campanha da cadeia H&M (Hennes & Mauritz), à vista em tudo quanto é estação de Metro e paragem de autocarros, tem como cara a Jerry Hall (ex- Mrs. Mick Jagger), já repararam? Assim até dá gosto andar de transportes públicos logo de manhãzinha... JR

quarta-feira, outubro 01, 2003

JOÃO RODRIGUES CABRILHO (?-1543): Sabiam que é a um navegador Português e à sua tripulação que se deve a descoberta e primeira exploração da Costa da Califórnia e do Oregon? Sabiam que a data da descoberta de San Diego, 28 de Setembro, é aí celebrada anualmente, tendo sido inclusivamente erguido em honra do nosso compatriota um padrão em sua homenagem (oferecido pela Marinha Portuguesa)? Já alguma vez ouviram falar em João Rodrigues Cabrilho?

Foi através de um post no blog da Paula, o Alma de Pássaro que ficámos ao corrente destes surpreendentes factos. Segundo ele nos conta:

"Ontem fui às festas de comemoração da chegada de Juan Rodriguez Cabrillo a San Diego. Desde há 40 anos que, todos os anos, se festeja este acontecimento no último fim de semana de Setembro, numa festa conjunta das comunidades portuguesa, espanhola, mexicana, índia e San-dieguense. É interessante ver como a cultura portuguesa está em força naquele local; até brochuras em português (de Portugal!) existem disponíveis."

Adiantando mais sobre as celebrações escreve:

"Ontem tive a sorte de acompanhar a comitiva oficial em muitos dos acontecimentos. O mais alto representante de Portugal era um alto posto da Marinha Portuguesa. O mais alto representante de Espanha foi o Embaixador de Espanha nos EUA. Em anos anteriores costumavam estar presentes membros do Governo português. Este ano, certamente devido à crise (ou a Congressos mais importantes), ninguém do Governo apareceu. Já para não falar de nenhum jornal, rádio ou televisão portuguesa, a quem o acontecimento não interessará, decerto, por não poder resultar em escândalo nacional."

E rematando, escreve:

"Eu própria não teria sabido deste acontecimento se não tivesse sido uma americana a dizer-me. E ainda bem que assim foi. Que bem que me soube o pão com linguiça e que orgulho foi ver os americanos vibrarem com folclore. Acho que fui decididamente atingida pelo espírito de Emigrante!"

A descoberta destes factos - tão surpreendente para nós como terá sido para ela – deu-me vontade de lançar mãos à obra para saber mais acerca deste ilustre desconhecido. Pelo vetusto “Dicionário de História de Portugal” não vamos lá. Parece que o venerando Professor Joel Serrão ignorava também a existência deste nosso antepassado. Seguindo o exemplo deste outro – igualmente ilustre – João, levantei amarras e naveguei (desta vez pela net) na busca de mais informações sobre as suas origens e feitos.

A sua data e local de nascimento são desconhecidas, embora entre os historiadores seja quase consensual que terá nascido em Portugal, tendo no entanto vivido a maior parte da sua vida nas colónias espanholas no Novo Mundo. Chegado ao México pela mão de Narvaez, prestou mais tarde a sua vassalagem a Cortez, ajudando na fundação da cidade de Oaxaca e juntando-se mais tarde a Alvarado nas suas expedições de conquista Mesoamericanas. Em 1542, já depois de se ter tornado um rico e abastado conquistador – muito por via da sua participação nos lucros da exploração de ouro na Guatemala – foi-lhe encomendada pelo vice-rei da Nova Espanha, António de Mendonza, uma viagem de exploração dos limites Setentrionais da costa ocidental da Nova Espanha.

Cabrilho partiu de Navidad (hoje Acapulco) a 27 de Junho de 1542, reinava em Portugal El-Rei D.João III. Comandando uma frota de dois navios, navegou para Norte em direcção à Baja Califórnia. Progredindo pela costa, descobriu Santa Catalina, a baía de San Diego a 28 de Setembro, San Pedro a 6 de Outubro e a baía de Santa Bárbara a 9 de Outubro. Embora tenha atingido Russian River (Sonoma County), locais como a Baía de San Francisco ou de Monterey passaram-lhe surpreendentemente despercebidos. É curioso notar que mesmo posteriores expedições falharam em conseguir descobrir estes locais. A própria baía de San Francisco só seria descoberta - por terra - em 1769 pela expedição Portolá (espanhola).

Chegado a este ponto, Cabrilho decidiu dar meia-volta, em busca de um porto seguro onde a sua expedição pudesse passar o Inverno, tendo a escolha recaído sobre a ilha de San Miguel, no Canal de Santa Bárbara, na qual fundearam a 23 de Novembro. Em finais de Dezembro ou princípios de Janeiro, Cabrilho e os seus homens envolvem-se numa escaramuça com os indígenas, tendo o Português falecido a 3 de Janeiro de 1543, após complicações decorrentes duma perna partida (gangrena?). Bartolomeu Ferrelo, seu compatriota, assume o comando da expedição, decidindo-se por uma nova tentativa para Norte, partindo a 18 de Fevereiro. A 1 de Março contornam Cape Mendoncino, chegando alguns dias depois a Rogue River (Oregon), a uma latitude de 43º Norte, o ponto mais Setentrional da viagem. Com uma tripulação exausta e minada pelo escorbuto, Ferrelo decide-se pelo regresso, visto a missão já ter sido cumprida. Na viagem de regresso, Ferrelo e os seus homens são fustigados por uma forte tempestade até alturas da ilha San Miguel, pela qual passam a 5 de Março. A 14 de Abril a expedição regressa a Navidad.

A expedição de Cabrilho teve pouco impacto. Nos anos que se lhe seguiram, a Espanha não faria qualquer reclamação territorial sobre estes territórios da Califórnia e do Oregon até aos finais do século XVIII, quando a colonização foi efectivamente iniciada. Os relatos da sua viagem foram impressos na "Colección de documentos para la historia de España" e na "Colección de documentos de Indias", ambas as obras impressas em Madrid e extremamente volumosas. Mesmo o leitor com mais “bagagem” é forçado a recorrer a informação acessória para compreender todo o contexto e detalhes da viagem. O mapa de Cabrilho seria publicado em 1770 pelo Arcebispo Lorenzana. O Português é hoje em dia reconhecido, de uma forma unânime, como o descobridor e primeiro explorador da costa Californiana. Apesar de ignorado no seu país de origem, a viagem de Cabrilho é mencionada de uma forma mais ou menos extensiva em qualquer obra de fôlego sobre a História da América do Norte. De facto, tudo o que era conhecido da Califórnia até 1769 deve-se à sua pioneira expedição, conjuntamente com as de Drake (1579), Gali (1584), Carmeño (1595), Vizcaíno (1602-1603) e Carreri (1696).

Pouco ou nada mais se conhece acerca de Cabrilho ou sua personalidade. É certo que terá sido educado como Católico, permanecendo fiel à sua fé até ao fim dos seus dias. Segundo os relatos, na sua personalidade era patente a nobreza dos seus actos, e o seu trato no contacto com os indígenas na sua derradeira viagem foi cortês e generoso. Pena que os indígenas de San Miguel não tenham retribuído na mesma moeda naquela fatídica manhã de Janeiro de 1543. Mas quais terão sido realmente as suas motivações e sonhos durante o seu agitado e invulgar percurso de vida? É inevitável uma comparação com Fernão de Magalhães, também ele um exilado voluntário, ao serviço da Coroa Espanhola. Quais as suas motivações para sair de Portugal? Seria um fidalgo de baixa nobreza cansado das intrigas da Corte? Um navegador menor em busca de aventura e oportunidades? Um ressabiado? Seria perseguido em Portugal? E nesse caso porquê?
Em minha opinião, diria que algumas destas razões – talvez todas – se combinam para explicar o percurso e feitos de João Rodrigues Cabrilho. Talvez mesmo a resposta não esteja em nenhuma delas. O que não deixa seja de ser claro é que muito da história das Navegações Portuguesas e seus Navegadores continua por ser escrita em Portugal. O contraste entre o entusiasmo com que esta efeméride é comemorada em San Diego e a nossa ignorância sobre o assunto (ou sobre os Bandeirantes, ou a presença Portuguesa na Tartária, Oceânia e Extremo Oriente em geral) mostra como ainda muito está por fazer no abrir de novos trilhos na nossa memória de Nação. JR

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